domingo, 19 de maio de 2024

bússola quebrada




mirar o ponteiro mudo

de uma nota virgem
catar na mente uma palavra
que desnude
revelar uma essência
rota, que não se traduz se não desbrava
querer saltar do ponteiro
ao mar, como se este fosse um Mirante costeiro
— e o mar é logo alí
tão perto
que se escuta os segredos que as ondas
sussuram às pedras
quando às lambe frenéticas
silencio o ponteiro
ao que miro as estrelas
e elas silenciam o entorno
o vazar dos jovens na esquina
com suas risadas
batendo as havaianas brancas no asfalto
volto ao ponteiro piscando na nota
— ele me convida
hoje o mar está FLAT
a lagoa, um espelho
a maresia impregna tudo
minha pele é uma Salina escoando
estive pensando na minha insanidade
de querer no mar de teus olhos, o Cais
mas justifico...
— já não sei quem sou
onde termino
e onde começa o mar
que sinto
como quem vê estrelas
silenciosas
aqui debaixo
ao nível do mar
— me sinto tão miúda
este ponteiro parece uma bússola
quebrada
me orientando para o nada
— fecho a nota
rosa



em alguma desordem

no azul onde cintila o dia
alguém me olha
escondido
me despe e teme minha nudez
pressuposta
pois
em alguma desordem
nas cores que habitam o dia
eu me mostro e me rasgo
- um outdoor que não se vende
*
minha nudez é um labirinto
e minha pele
um mar de afagar
vendavais
em alguma desordem
me sinto indigna
desse azul
mas finjo ser
um cardápio a se degustar
cru
em alguma desordem
alguém opta pelo cinza
e pelo contraste
tendo todas as cores disponíveis
- morre de medo de mim,
com razão
... em alguma desordem nós feras
não sabemos
quem é o caçador perverso da aldeia
quem é a caça em noites de lua cheia
em alguma desordem
fica suspenso
o verso
talvez eu,
talvez você,
talvez nenhum dos nós...
talvez¿
rosa ataíde

terça-feira, 7 de maio de 2024

o tato e o poro



o mais aberto 

o mais dado


o mais explorador

o que mais sente


exposta ao lado a catapora mãe 

na anca, cicatriz 

que arrepia toda extensão da pele


ao toque suave do dedo

que desbrava 

o corpo

exposto à meia luz 


desliza ainda o tato

o entorno esbarrando outros tantos poros 

entre cafrios


pressiona o que cobiça memorizar 

e mais uma vez o toca

o experimenta


...e segue caminho

ventre à fora

ao encontro de onde se perder


- a perdição

me diga...

é sempre necessária ao encontro?


que o diga 

teu dedo mais atrevido 


rosa a.

domingo, 21 de abril de 2024

o corpo mulher




o corpo pulsar

nascentes

vermelhos dos dias tensos e quentes 

âmnio que envolve o nascer a semente 

afeto, instinto que materna aleitamento 

suores lágrimas, mares, ponto de partida

entre as pernas


o corpo mulher

vendavais 

perfume de mulher

cabelos a tracejar dorsais caminhos

labirintos


o corpo mulher fogo

acende 

aquece

simula faiscas suspensas 

forja

vida, outro corpo à gerar


o corpo mulher terra

- é de abalo sísmico este corpo?

a provocar

o corpo que a quer 

adentrar e se perder

- é de lascívia este corpo?


o corpo mulher

abrigo de feras

em suas matas

a desbravar clarões 

tempestades e bonança 


mas que não cede à luta

o corpo mulher que pede

e clama e aceso chama

- venha, fazer Amor comigo 

- e apaziguado o corpo 

faça nascer enfim

...tempos de Paz

ou o fim de todos os tempos

quando o corpo goza e pleno

faz entontecer seus amantes 


rosa a.

Varal

 



lavo a roupa 

enxugo as lágrimas

torço o nariz

me viro do avesso


fico suspensa ao ar pregada numa corda 

para que uma brisa me seque

e a plenitude me ultrapasse


mas meu corpo...  garoa


rosa a.

...Amor

 


não se dá nome às putas


as putas são doadoras do gozo

à elas é dado o direito ao anonimato


e nem seus nomes de guerra devem ser revelados

pois tal ato fazem dela amantes


como sei? 


fui traída com algumas e nunca soube

seus nomes, tamanha a perversidade da traição 


nem eu era amada, sequer elas seriam


segredo velado? ou caridade dada a quem te traz o ejaculado, pago? 

eu devia ter perguntado


se fosse uma

exigiria o gozado direito de gozar em sua boca...

clemente que me fosse dado um nome

daria-te meu gozo em face, como um brinde

um gif de prazer em caso de cam ligada 


como queres que eu goze?

em teus dedos no caso de você sentir o meu úmido sexo?

em sua língua ao me lamber até que eu convulsione?

em teu pau, ao sentir você firme, e tão teso, e tão úmido 

pingando o pré gozo?


queres saber como gozo?

te convenceria o dizer apenas?

- gozo assim, gozo deste jeito...

sem te olhar nos olhos, numa luta

entre pudor e desejo


ou queres saber como uma puta goza de verdade

ou se eu,

sou puta ao me dar?


afinal amor


és inexperiente... ou cliente assíduo de uma puta só?


nesse caso dê nome a prima, sim

pois isso já não é comércio ou luxúria...


é amor, é fé na dama santa

que ganha o pão nas esquinas

fantasiada de boneca


enquanto você não se satisfaz na fonte de meu corpo 

que a ti é dado por partes articuladas

pequenos pedaços de mim

que mostro despudorada flor despetalada


uma puta casta 

uma imagem surreal de quem está de fato em pedaços 

diante uma câmera ligada no modo contínuo 


um disparate

na noite solitária de um quarto


Rosangela Ataíde

quarta-feira, 29 de junho de 2022

peau



A ideia da pele sobre a pele, progride, avança dia a dia. Não se seduz para espanto! O desejo que aqui, antes velado busca haver no chão, um espaço. Contrariando sentenças, pousa insistente e consumidora de toda noção de apetite ou razão a que se faça estas ditas ideias. 

Assim, pele sobre pele, não há ainda ato, apenas intento. Ao progredir, esta mão discorre a tocar suave cada nota deste seio em arrepio. 

Desperta! Encontra entonação e afinidade... Nota próximo, o manifestar das atitudes de quando a  pele encontra a pele e transcende. Deixa fluir o corpo excitado, extenso à entrega. Não só devaneias a saciedade.


rosa ataíde


me cativa?

eis a lésbia,

a poética,

a habitante destes delírios


que divago

mas não firmo

a coragem de deitar


e se renego por coragem 

ou medo?

não sei  -

mas digo –


ela é a mesma que se deita

comigo

e encaro frente ao espelho

cio pós cio


rosa ataíde


lentamente

Vaga sua nudez

in lost

diante de minha

despida euforia.


Vibro,

eu ardente por seu

corpo sobre o meu.


Cálida

a noite desponta

maliciosa.

Instigada!

Que demore

alvorecer o dia.


rosa ataíde

intenções



intento tua língua

tateando a minha

causando suspiros

intento tua língua

docemente em minha tez

tatuando tua marca

teu efeito e tinta

intento ainda  sem saber se certo

ou se desconcerto

teu sêmem e saliva

indo de encontro ao meu gozo 

saciando meu cio


rosa ataíde

fome

 a fome

que tenho

é na alma


a fome 

que tenho

é na pele

comovente

que te atrai


devoradora

a fome

que vem 

é a mesma

que vai


a fome que 

você não vê 

nem sente 

e não satisfaz 

rosa ataíde